8 de nov. de 2016

Mini-empregos

Estou de regresso a Colónia e ao frio que gela os ossos. Colónia é uma cidade calma, com os seus encantos mas é a Alemanha! No Inverno é fria, cinzenta e fica escuro tão cedo que nem há tempo para viver. A casa de cada um é o mundo onde tudo se passa. Para combater a claustrofobia restam os supermercados* e os cafés.
Resolvi ir ao Van Dyck. Considerado um dos melhores cafés de terceira geração de Colónia. São "roasters" e moem o café na hora. Posso confirmar que o café é muito bom, até porque o consumimos em casa também e o cappuccino é quase tão bom como o do Doubble Eye em Berlim. Merece um visita: cuidado, fecha cedo e ao domingo.
Apesar do delicioso cappuccino (e um pastel de nata bastante razoável!) posso dizer que o espaço é estranho e pouco acolhedor. Não estava cheio quando cheguei - os cafés em Colónia enchem a partir das 4h, hora em que todos saem do trabalho e os sítios se tornam insopurtaveis para alguém que aprecie a calma - mas a única funcionária estava ocupada a servir alguns clientes. Olho para ela e sorrio. Não retribui o olhar e muito menos o sorriso. Não é que seja antipática - é alemã!
Sento-me e espero pacientemente que me atenda. Entretanto chegam 2 novos clientes que, mais pro-activos do que eu, se aproximam dela, conversam, fazem perguntas e, claro, sāo atendidos. Nāo gosto mas esforço-me por compreender. Levanto-me para garantir que me vê mas ela continua sem olhar para mim. Chega mais um clente que faz o mesmo que os anteriores e ela, agora com a ajuda de uma colega, começa também a atendê-lo. Para mim chega! Pergunto-lhe num tom controlado se fala inglês? Diz que sim. Digo-lhe entāo, tentando nāo soar muito irritada:
- I don't mean to be rude but it's the third person you attend before me and it is very unpleasant! I want a cappuccino and a pastel de nata, please!
Ela olha para mim atónita e talvez nem tenha percebido nada?!...
Sou prontamente atendida embora sem sequer um pedido de desculpas, apenas profissionalismo!
Alguém me diz que nāo ligue, que sāo jovens sem formaçāo em hotelaria que coleccionam mini-empregos a ganhar 400€.
Mini-quê?
Mini-jobs: a nova moda alemā dos part-times. Nestes mini-empregos nāo há segurança social nem saúde, sāo aquilo a que chamamos biscates, que potenciam a economia paralela, o pagamento por baixo da mesa. 
E é esta a economia que nos quer dar liçōes, que muitas vezes queremos mimetizar, a economia que também nāo respeita os seus cidadāos, especialmente os mais vulneráveis. Aquela economia dos sindicatos fortes (como o dos metalúrgicos) e dos Concelhos de Trabalhores (Betriebsrat - tāo importantes nas negociaçōes com a Auto-Europa, por exemplo!) Muito bem! Mas pergunto-me se esta cultura do sindicalismo ainda é uma opçāo política e cultural consciente e colectiva ou é o resquício de um tempo em que as políticas socialistas de defesa dos trabalhadores imperavam e cujas conquistas nāo se podem eliminar de repente, sem provocar oposiçāo séria de uma boa parte da opiniāo pública, como talvez fosse a vontade de governos mais liberais como os que têm governado a Alemanha?
Afinal seguem o mesmo caminho dos outros, o caminho que quiseram impôr aos outros (leia-se países do sul): toleram ostensivamente uma economia paralela gigante, fragilizam as pessoas criando condiçōes para que aceitem cada vez mais precariedade e menos apoio social e assim percam força reivindicativa, enquanto paralelamente sustentam um exército de adormecidos através de uma política social paternalista e anestesiante.
Os alemāes nāo representam a minha Europa, acredito até, talvez de forma radical, que "o tal", o indefenido e indefenível "espírito europeu" é do Sul, é quente, é humanista, como nós "os do Sul". Quando o Tsipras e o Varoufakis sugeriram acabar com os estágios e afins como formas de explorar os mais fracos e de mascarar estatísticas, e assim criar empregos reais e com direitos, iam-nos crucificando...
Se eu nāo desculpo um empregado de um café português que me atenda mal, mesmo sabendo que frustraram as suas expectativas depois do curso superior e que lhe pagam pouco mais que 400€, nāo por um part-time mas por 8 ou 10 horas de trabalho, muito menos quero desculpar um alemāo que vive num país cuja prosperidade lhe dá todas as armas para que reaja e se oponha.
E nāo, nāo é só em Portugal que estas coisas acontecem, nāo, Portugal nāo é o pior. 
Sabem que mais? Viva Portugal, viva o Sul!

(*) Supermercado é uma expressāo que raramente se aplica na Alemanha. Eles têm muitos minimercados do tipo dos nossos Pingo Doce ou mais pequeno e isso é muito bom!!

A visitar em Colónia / Köeln
Van Dyck Rösterei
Körnerstrasse 43



Situa-se em Ehrenfeld, considerado um dos bairros mais trendy de Colónia. Bem calmo à primeira vista mas onde acontecem muitas coisas. Aqui encontram-se várias lojinhas alternativas, o CBE -um bar underground situado na cave da estaçāo de comboios, muita street art, o LiteraturKaffé, muitos restaurantes da moda, os melhores gelados de Colónia, etc.  É preciso visitar com calma, perder-se nas ruas e explorar.

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